top of page

ENTREVISTA: MÔNICA GUTTMANN

 

Z.: Há mais de um tipo de empatia?

 

MÔNICA GUTTMANN: Acredito que existem vários níveis de empatia. Tem a empatia onde eu reconheço a minha dor na dor do outro, e aí independe até da idade, até uma criança pode ser empática. Há crianças que são muito empáticas com a dor da outra que vive algum tipo de sofrimento, de privação, e outras que não são. Por isso que eu acredito que tem uma empatia que vem com

a alma da pessoa. E tem níveis de empatia que a gente pode desenvolver. 

 

Z.: É algo que pode ser ensinado? Como?

 

M.G.: A capacidade empática é algo que, muitas vezes, na maioria das vezes, já nasce com a pessoa. São almas mais empáticas, mas

a gente, sim, pode aprender empatia. A gente pode, inclusive, fortalecer a empatia. À medida que a gente vai se trabalhando e curando as nossas feridas, a gente consegue ter uma capacidade empática mais sem defesas. Mas, em geral, até por termos feridas,

a empatia acontece por identificação, porque a nossa alma se identifica com a do outro. 

Quanto a desenvolver a empatia, aí eu acho que entram exercícios de auto-educação desde criança, trabalhando sentimentos, cuidando das próprias feridas das crianças para que elas possam, realmente, conseguir escutar, conseguir olhar. Eu já vi alguns países, a Dinamarca, por exemplo, em que a empatia é ensinada na escola, desenvolvida lá. Aliás, é na escola que a gente sofre os primeiros movimentos ou de empatia ou o oposto, que é o desrespeito, o bullying, ou o desprezo. A gente vive na escola, na infância, situações muito extremas até, de crianças que são muito empáticas e de crianças que são muito abusivas e defendidas.

Todos nós temos a semente da empatia, todos. Mas ela pode não ser usada a vida inteira se não for trabalhada e, muitas vezes, as pessoas precisam mesmo de ajuda para abrir esse canal.

 

Z.: Neste momento de pandemia, muitos estão descobrindo sua importância. Há relatos de que ela aumentou, com maior colaboração entre vizinhos e com pessoas em grupos de risco. Essa percepção está correta? Por outro lado, há pessoas que, com atitudes inconsequentes, colocam a sua vida e a de outros em perigo. 

 

M.G.: Eu percebo que aumentou a solidariedade em muitas pessoas, e solidariedade é uma coisa e empatia é outra. As duas podem vir juntas. A empatia é mais profunda. Por isso que eu acredito que é um lugar da alma mesmo, que a gente pode acessar pela educação, mas é mais profunda. Eu sinto a dor do outro em mim. E aí eu quero ajudar, eu entendo a dor do outro. Às vezes eu posso nem conseguir ajudar com uma atitude mais física, mas só o fato de entender já é uma conexão. A solidariedade pode vir junto com a empatia, mas também pode ser uma atitude mais mecânica, ou mais racional, ou às vezes conectada com algum valor religioso, ou a partir do medo. Eu acho que a pandemia gerou e gera muito medo e sofrimento nas pessoas. Então elas se tornam mais solidárias, mais generosas, por conta, muitas vezes, do medo ou de valores religiosos, ou de questões éticas. E tem aquelas que sempre foram empáticas e sempre foram generosas, e, durante a pandemia, isso só aumenta. O sofrimento é um canal, sim, para a empatia, mas não necessariamente é o único. Tem pessoas que são empáticas não a partir da dor do outro só, mas são empáticas na alegria do outro, na felicidade do outro, no sucesso do outro, não apenas na dor. O sofrimento que a pandemia está gerando, eu percebo que também está criando extremos, polaridades. Tem pessoas que se tornam mais solidárias, mas empáticas, e outras, mais egoístas. Eu acredito que o sofrimento abre o coração para a solidariedade, mas também abre e levanta muros defensivos, porque eu tenho medo, porque eu preciso me proteger por me sentir muito ameaçada. Então eu coloco muros em relação à vida, em relação aos outros, em relação a tudo aquilo que me ameaça.

 

Z.: Como uma pessoa consegue realmente ajudar quando a outra lhe conta um problema? 

M.G.: Uma das características importantes da empatia é a escuta sem julgamento, é a escuta da alma, do coração. Qualquer julgamento já fecha o coração. A empatia implica em não julgamento, não tem como. Por trás de uma pessoa que comete, muitas vezes, atitudes agressivas, violentas, destrutivas, existe um ser humano ferido ali. Isso não quer dizer que você precisa aceitar e conviver com isso, mas dá para sentir empatia, dá para se conectar com a dor daquela pessoa que levantou aquela personalidade tão cruel, muitas vezes. 

OBS: Não perca, ao lado, vídeo da autora.

 

Mônica Guttmann é psicóloga, arteterapeuta e escritora, autora de mais de 40 livros para o público adulto e para o infantojuvenil. Professora no Sedes Sapientae, no Instituto Palas Athena e professora convidada em universidades e instituições culturais no Brasil e no exterior.

Psicologia
Empatia: colocar-se no lugar do outro, sentir a dor ou a felicidade, tem tudo a ver com a formação de comunidade
bottom of page