Psicologia - Sensações
Resiliência e criatividade: podem vir separadas, mas, quando somadas, podem abrir possibilidades inimagináveis
Conversamos com Mônica Guttmann, psicóloga, escritora e arteterapeuta, sobre resiliência e criatividade
Resiliência e criatividade, como esses dois movimentos estão conectados? Será que todas as pessoas resilientes são criativas? Será que todas as pessoas criativas são resilientes? Na minha opinião, não necessariamente.
A resiliência é uma força interna, muitas vezes instintiva e muitas vezes hereditária, cultural, muito inspirada em crenças. Frequentemente a resiliência vem de uma força que a gente nem imagina e só se dá conta que tem quando a vida nos exige.
De toda maneira, pessoas resilientes são aquelas que conseguem lidar com situações desafiadoras, ameaçadoras e, muitas vezes, perigosíssimas e drásticas, como a guerra, a fome e a violência. Algo dentro delas impulsiona para a vida, algo dentro delas faz com que elas se agarrem à vida, não necessariamente à esperança, mas há algo que faz com que elas escolham a vida a cada instante. Tem pessoas resilientes que escolhem a vida por medo da morte, por medo de morrer, e aquelas que escolhem a vida por amor à vida, por desejo de viver, por desejo de realizar coisas que elas sentem que não terminaram de realizar, por seguir sonhos que elas ainda acreditam que elas podem vivenciar. Então, a resiliência é inspirada por várias motivações.
Muitas vezes, a criatividade, somada à resiliência, dá um impulso cada vez maior, ela abre caminhos mais favoráveis, caminhos mais inesperados. Mas, mesmo sem a criatividade, apenas o impulso de sobreviver já é uma força inimaginável.
A criatividade, todos nós, humanos, sabemos o que é, porque não existe um ser humano que não seja um pouco criativo. Mas existem aqueles que conseguem acionar sua criatividade de uma forma mais consciente, mais clara, mais corajosa, com mais autoestima, com mais amor próprio.
Criatividade e autoestima também não são diretamente ligados. Tem muita gente com falta de amor próprio e auto estima baixa que é muito criativo. De novo, criar, criatividade, é uma forma de eu agir a partir de alguma ideia, uma imagem, uma necessidade que seja diferenciada, que seja diferente, que possa promover um novo caminho, que ainda ninguém alcançou dessa forma. Então, resiliência e criatividade somadas unem forças, abrem possibilidades que a gente não imagina.
A gente pode desenvolver resiliência e criatividade? Sim, a gente pode treinar resiliência e a criatividade. Aí eu acredito que a junção de um trabalho com a autoestima, com o amor próprio, com a força da imaginação, com a força da criatividade. Juntas, elas oferecem mais instrumentos para que as pessoas possam superar desafios que nem elas mesmas imaginavam que pudessem superar.
Hoje em dia, mais do que nunca. Eu digo mais do que nunca porque cada vez mais os desafios vão ficando mais sofisticados, o desafio humano de sobrevivência, de superar abusos, violências, injustiças, preconceitos, isso é muito antigo, mas a forma com que hoje em dia tudo isso nos invade, nos violenta é muito mais sofisticada e trágica, no sentido de ser muito mais rápida e mais fora do nosso controle. A inteligência artificial ela contribui muito para isso, da mesma maneira que contribui para maravilhas e para o desenvolvimento humano, ela também contribui para que as ameaças se tornem muito mais reais e concretas. Então, resiliência, criatividade, autoestima, unidos, geram força, inspiração e transformação.
Como a gente pode ajudar as pessoas a resgatarem ou desenvolverem a resiliência e a criatividade? Primeiro fazendo esse trabalho de resgate ou de encontro com a autoconfiança que vem do propósito de vida.
Uma pessoa sem propósito não tem porque se sentir agarrada à vida. Uma pessoa que não tem relações afetivas profundas também não se sente ancorada na vida. Uma pessoa que não se sente amada também não tem uma força de vontade de permanecer viva e ir realizando, E a criatividade vem junto com isso.
Como eu posso estar no mundo, aproveitando a vida, contribuindo, criando gestos mais amorosos, me permitindo a receber a amorosidade da vida com mais consciência, com mais fé e com uma direção - uma direção que tem a ver com aquilo que eu hoje, com a minha idade, com a minha consciência, com tudo aquilo que eu já vivi e ainda quero viver, tenho como propósito de construir, de seguir construindo, que eu quero ressignificar e de que forma que eu quero dar um novo significado para minha vida até o tempo que ela durar. Isso é uma construção e vale muito a gente compartilhar sobre isso porque a gente soma junto com o outro. Ideias, sonhos, vontades e vulnerabilidades. Construir resiliência e criatividade em conjunto ganha força.
Mônica Guttmann é psicóloga, escritora e arteterapeuta..